quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Monte Roraima

Uma fortaleza natural guarda os segredos de um dos ambientes mais exóticos de nosso planeta: o Monte Roraima, na fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana. Este grande tepuí (ou mesa), cujas altitudes de topo oscilam entre 1000 e 2800 m, inspirou lendas e mitos dos povos nativos e de exploradores europeus durante séculos. Povos nativos que viviam na floresta tropical ou nas grandes savanas que cercam o monte, acreditavam que o monte havia se erguido do solo como punição à mácula de uma árvore sagrada. O Monte Roraima também seria o lar do deus Makunaíma, que controlava os trovões.

O magnífico platô do Monte Roraima sobre as nuvens. 
Monte Roraima visto à distância.
Exploradores ingleses avistaram a montanha pela primeira vez em 1595, batizando-a de Montanha de Cristal, devido às quedas d'água cristalina que vinham do topo. Estes exploradores consideraram os paredões intransponíveis. No século XIX, a febre por explorações de naturalistas em busca de novas descobertas levou muitos exploradores a tentar chegar ao topo do monte, feito conquistado por sir Everard im Thurn em 1884. Este também foi um período de surgimento de novas lendas, como da existência de seres pré-históricos ou povos primitivos no alto do platô. Algumas destas lendas inspiraram o escritos sir Arthur Conan Doyle, que em 1912 lançou "O Mundo Perdido". Este clássico da literatura conta as aventuras do fictício professor Challenger em um platô isolado na América do Sul, onde dinossauros e outros seres extintos viviam, e onde povos indígenas lutavam contra homens-macacos primitivos. Recentemente, estas histórias inspiraram a animação Up!, da Pixar, que reconstrói de forma excelente as paisagens do topo do Monte Roraima.
Queda d'água no Monte Roraima. Fonte: Sertão Expedições.
A realidade é muito diferente da ficção, mas não menos impressionante. O platô e seus paredões abrigam espécies endêmicas de insetos, aracnídeos, répteis e anfíbios, além de inúmeras espécies de fungos e plantas. Esta variedade é resultado do isolamento geográfico do platô e de condições climáticas específicas, muito diferentes das planícies circundantes: uma estação seca e uma estação úmida, e temperaturas entre 20 e 32° C, mas com mínimas de até 8° C nos pontos mais altos.

Geologia e Geomorfologia

O Monte Roraima é composto por rochas sedimentares e vulcânicas depositadas em uma antiga bacia sedimentar desenvolvida sobre o escudo das Guianas, a Bacia Roraima. Rochas depositadas nesta bacia afloram em partes do norte do Brasil, Venezuela, Guiana e Suriname, e totalizam uma espessura de aproximadamente 2900 m. Datações das rochas vulcânicas que pontuam o empilhamento sedimentar resultaram em idades entre 1,8 e 1,6 bilhões de anos. Ou seja, essas rochas são tão antigas que, se voltássemos no tempo, não seríamos capazes de reconhecer nosso planeta!

O Monte Roraima visto à distância. Fonte: Adventure Club.
Onde hoje é o Monte Roraima veríamos um vasto mar interior conectado ao oceano, cercado por uma paisagem rochosa de montanhas escarpadas e vulcões. Neste período, a forma mais avançada de vida era de bactérias autotróficas - sua fotossíntese pouco a pouco liberava oxigênio na atmosfera. A falta de vegetação para proteger o solo da erosão permitia que os processos de denudação do relevo atuassem com eficácia muito maior do que hoje em dia, o que resultou em depósitos sedimentares em geral mal selecionados, misturando grãos de diferentes tamanhos e composições minerais.
Apesar da longa história deposicional da Bacia Roraima - aproximadamente 200 milhões de anos -, o Monte Roraima é composto apenas pelas últimas duas formações: a Formação Uailã (base do monte) e a Formação Matauaí (topo do monte). A Formação Uailã é composta por espessas camadas de arenitos conglomeráticos a arcoseanos, intercalados com rochas de origem vulcânica como tufos e ignimbritos. A Formação Matauí registra uma fase de continentalização da bacia: arenitos formados em uma região litorânea influenciada por marés dão lugar a arenitos eólicos e que compunham antigas dunas e, finalmente, a arenitos imaturos de origem fluvial.

Monolitos de formas diversas sobre o platô. Fonte: Thinkstock.
"Jacuzzis" desenvolvidas sobre o arenito. Fonte: Correio do Brasil.
A composição predominantemente de arenitos intercalados com rochas vulcânicas é muito importante para as características geomorfológicas atuais do Monte Roraima. Após a deposição, conforme a bacia era soterrada e se tornava inativa, o aumento da temperatura e pressão e a circulação de fluidos pelas rochas permitiram sua litificação - a transformação de sedimentos inconsolidados em rochas. Os fluidos em circulação levavam consigo parte da sílica das rochas vulcânicas e dos grãos de quartzo dos arenitos. A posterior precipitação desta sílica ocasionou a cimentação destas rochas, o que as tornou resistente à erosão.

Quartzo no "Vale dos Cristais". Foto: Claire Taylor.
Assim, mesmo em uma região de clima tropical com alta pluviosidade, os arenitos da Formação Matauí conseguem sustentar o relevo em forma de mesa do Monte Roraima. As chuvas diárias sustentam as quedas d'água originadas no platô durante todo o ano. Mas a ação erosiva da água resultou em formas fantásticas sobre o platô, como monolitos de diversas formas resistentes à erosão, formação de "tapetes de cristal" (exposição de camadas com concentração de quartzo), "jacuzzis" (buracos feitos pela turbulência da água em períodos mais chuvosos), entre outras. A circulação de água com alta energia na estação úmida também foi responsável pela escavação de grandes cavernas, que consistem em habitats exclusivos sobre o platô. Nas épocas de chuva, rios e cascatas subterrâneos se formam nestas cavernas.

Como chegar

O acesso de turistas ao Monte Roraima pode ser feito tanto pelo Brasil quanto pela Venezuela. No Brasil, a região se encontra dentro do Parque Nacional do Monte Roraima, administrado pelo IBAMA. Como se trata de uma região de conflito de interesses de povos indígenas nativos, e garimpos ilegais, não há estrutura para turismo e a prioridade de autorização para o acesso ao monte é para pesquisadores. Assim, para ascender ao platô é necessário organizar uma expedição bem treinada em trekking e escalada, com guias e carregadores, e com as devidas autorizações do IBAMA. O ideal é contratar uma empresa ou agência especializada. O acesso pela Venezuela é menos burocrático, mas os cuidados são os mesmos: as trilhas são pesadas e exigem vários dias de caminhada. Neste caso, porém, existe a possibilidade de realizar um voo de helicóptero para o platô, em expedições que duram de 2 a 4 dias. As expedições saem da cidade de Santa Elena de Uairén.
Voo de helicóptero para o Monte Roraima. Fonte: Roraima Brasil.


Para saber mais:

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Uma cratera em chamas no deserto.

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